quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Artigo publicado no “Sunday Times” por Daniel Depp

Daniel Depp, o meio-irmão de Johnny Depp escreveu um longo artigo, porém bem interessante. Nele, ele fala com sinceridade sobre Hollywood e também como foi filmar ” O Bravo”. Além de chamar Johnny de “irmão estrela de cinema”.

Artigo publicado no “Sunday Times” no último Domingo – 08 de Agosto.

Cemitério dos sonhos despedaçados: Sendo irmão de Johnny Depp, o escritor Daniel Depp queria uma carreira em Hollywood, tudo o que conseguiu, ele diz, foi uma passagem só de ida para o inferno desenvolvido.

Irmão, você pode me dar um trocado?

Por Daniel Depp

Fui para Hollywood aos chutes e berros. Eu não queria ir. Honestamente. Eu sabia que seria um desastre, e foi.


Fui para Hollywood aos chutes e berros. Eu não queria ir. Honestamente. Eu sabia que seria um desastre, e foi.

É claro que fui. Pelos motivos mais comuns.Eu sou tão ganancioso quanto qualquer cara, e, há muito dinheiro em Hollywood. Também sou ligeiramente louco por poder, o que ajuda. E eu amo filmes. O que ao contrário do que você poderia pensar,na verdade não ajuda. Eu também já falei que há muito dinheiro em Hollywood?

No início dos anos 90, eu morava no Maine. Há partes do Maine que são lindas,mas esta não era uma delas.Se você quisesse fazer um enema no litoral leste dos Estados Unidos, o lugar que eu morei seria provavelmente onde a mangueira iria entrar. Havia uma esposa que trabalhava. Havia um bebê de um ano de idade e havia eu para tomar conta dele. Havia muitas árvores. Havia um veado que costumava ir ao meu quintal todos os dias. No início eu costumava dizer para a criança: “ Olhe um veado, que graça!” . Ao final do segundo mês, era assim: “ Olhe o veado de novo, ele esta sorrindo para o papai, vamos estourar os seus malditos miolos.”

Eu dei para a criança muitas panquecas e tentei escrever um romance. O romance se tornou um roteiro, então um romance novamente, e então, um roteiro. Existem alguns críticos que dizem que eu ainda tenho este problema. Como o personagem do meu romance “Loser’s Town” um cara triste parecido com o Bisonho, com altas expectativas, mas cujo os planos nunca tiveram sucesso, eu não estava feliz.

Então veio o telefonema do meu irmão, a estrela de cinema, ( tecnicamente meu meio-irmão) . Ele estava fazendo Eduardo Mãos de Tesoura na Fox. O burburinho em volta do filme era bom e os estúdios estavam finalmente olhando para ele como se ele pudesse fazê-los ganhar dinheiro. Este é um bom lugar para estar em Hollywood.

““Você tem que vir para cá” disse meu irmão estrela de cinema.” Há muito dinheiro.Vamos explorá-los em cada centavos que pudermos. Porém temos que nos apressar,não vai durar por muito tempo. “Cedo ou tarde eles perceberão que não sei atuar.”

“Acho que vou ficar por aqui”, disse. Eu estava realmente tentando gostar do Maine. Havia muitas árvores, por exemplo. Uma pessoa tem que gostar de árvores.Infelizmente eu não gostava.” Você não pertence a este lugar” disse meu irmão.” “Você está ficando maluco. Eu ainda vou ler sobre você picando pessoas com um machado.”.Eu acho que ele estava verdadeiramente preocupado com isto, especialmente desde que eu descobri que uma grande quantidade de vodca torna as árvores mais fáceis de se lidar.

“Não.”, eu disse.

“Olhe, nós poderíamos fazer o que nós sempre falamos, lembra-se? Nós poderíamos fazer filmes juntos”.

Ah. A Twenty Century Fox tinha oferecido a ele um contrato progressivo.Um contrato progressivo é quando o estúdio oferece a um ator ou diretor uma grande barganha. Nós te damos um escritório e algum dinheiro, e você nos deixa assistir em primeira mão qualquer filme que você decidir fazer. Ótimo.

Exceto que não é. Ninguém mais faz contratos com atores, não como nos velhos tempos de Clark Gable. Hoje em dia os atores estão em todas as partes, e um contrato progressivo é como colocar sal na calda de um pássaro. Não deixa eles voarem.

A verdade é que os contratos progressivos são inúteis. Ah, de vez em quando alguém consegue fazer um filme.Geralmente, o que acontece é que o ator importa seu irmão ou uma atriz importa seu melhor amigo gay para administrá-lo, eles conseguem um escritório legal e, enquanto durar o contrato, todos fingem ser produtores e almoçam muito. Até eu sei disso.

Tudo é muito excitante no início. É como namorar a garota mais bonita que você já viu, até você perceber que ela não tem a menor intenção de dormir com você. O negócio e que você nunca tem certeza. Daí a popularidade do contrato. Todos querem estar no cinema. É como a barata de um sonho: você nunca consegue matá-la. Eu disse ao meu irmão estrela de cinema que pensaria a respeito.

Então eu fiz a coisa mais razoável e madura. Tranquei-me no banheiro com uma garrafa de vodca russa, fique completamente bêbado e subi em um avião para Hollywood.

Eles foram muito legais comigo na Fox.Mas eu era o irmão da estrela, então eles tinham que ser legais.Me deram algum dinheiro- para mim muito naquele tempo- e um assistente pessoal. Me deram um lindo escritório com uma janela grande que dava vista para um jardim de rosas e um caminho que os executivos faziam toda hora do almoço para a cafeteira.

“Nossa”, disse para as pessoas que estavam mostrando o escritório para mim “eu posso descer as calças e mostrar as nádegas para eles enquanto passam”. Ninguém achou engraçado. Em retrospectiva, isto se resume todo o meu tempo em Hollywood. O problema é que eu não tinha o menor respeito pelo lugar. Não tinha naquele tempo e não tenho hoje. Eu não me importava ( não me importo ) com o tipo de filme que eles querem fazer ou os modos como eles querem fazê-los. Eu acho que o culto ao estrelismo é perigoso para os atores e para arte, e eu acho que a idéia de fazer filmes só por dinheiro e um gigantesco desperdício de celulóide e um veneno para a alma humana.

Então por que fui? Porque sou estúpido!

Se tivesse ido só pelo dinheiro teria feito melhor. Eu sou esperto e manipulador e tenho um bom olho para as coisas boas da vida. Eu gastaria uma fortuna e seis horas num almoço. Eu sou tudo que um bom produtor ou uma personalidade limítrofe deveria ser. Por isto as pessoas não podiam entender porque eu continuava dando tiro no próprio pé.

Eu fui para Hollywood porque eu amo cinema e eles não. Fui para Hollywood para provar um ponto de vista , que era: você poderia fazer um bom filme por menos do que o orçamento nacional e que estes filmes poderiam, de alguma forma, honrar o espírito humano e ainda fazer um pouco de dinheiro.

Eu estava claramente arruinado numa idade jovem por Bergman e Truffaut e Godard e Cassavetes e, sim, vamos admitir, caras como Jonas Mekas, o crítico e cineasta que costumava escrever sobre filmes avant-garde para o Village Voice. Ir para Hollywood com este tipo de experiência é como pular dentro de um covil de cachorros selvagens com uma costela de porco no seu traseiro. E de qualquer forma, eu estava procurando por briga. “ Viel Feind, viel Ehr” diz o ditado alemão. “Muitos inimigos, muitas honras”. Bem, a primeira parte era verdade.

Foi um desastre, como era de se esperar. Passei a maior parte do tempo em reuniões sem sentido e lendo roteiros que eram perfeitamente bons, mas nunca iriam ser financiados. Eu ficava de coração partido de sentar à mesa com os escritores e dizer não a eles. Eu continuei a enviar projetos muito bons, e as pessoas ficavam entusiasmadas- e, então os projetos morriam um após o outro. Era como olhar seu amado peixe de estimação morrer em sequencia.

Aí eu percebi que estava sendo trapaceado por alguém que eu confiava,e enviei um projeto por de trás de suas costas. Desta vez os executivos ficaram animados, parecia que teríamos uma chance para fazer algo. Isto foi numa sexta-feira, eu me lembro. Na segunda-feira cedo eu recebi um telefonema da pessoa que estava me trapaceando, dizendo vários nomes e me garantindo que eu estaria morto muito antes de conseguir fazer um filme em Hollywood.

Isto é verdade. Eles realmente dizem coisas deste tipo. E impossível escreve sobre Hollywood sem usar clichês porque as pessoas são clichês.

O filme não aconteceu. A pessoa que me trapaceou está indo muito bem. Por outro lado, eu ainda não estou morto, mas tenho minhas dúvidas quanto a fazer filme em Hollywood.

Nós conseguimos fazer um filme por fim, mas não em Hollywood.”O Bravo” foi essencialmente um filme estrangeiro filmado em solo americano, financiado depois de termos negociado nosso caminho através do Festival de Filmes de Cannes , passando a rede no dinheiro europeu. “O Bravo” acabou por estrelar meu irmão estrela de cinema e Marlon Brando, e foi baseado em um livro de Gregory Mcdonald. Era a história de um cara pobre que mora num lixão e concorda em deixa-se ser morto num filme rapé por dinheiro suficiente para tirar sua família da pobreza.

Não, não era comédia. Era, na verdade o livro mais deprimente jamais escrito. Já havia um bom roteiro quando eu consegui o projeto, mas era igualmente deprimente e igualmente infilmavel. A esta altura o projeto havia se tornado uma lenda de Hollywood. Estava amaldiçoado. O roteiro havia sido vendido em todos os lugares, vários atores importantes haviam se ligado a ele e, então se desligado. Todos concordavam que o roteiro original era brilhante, mas ninguém conseguia enxergar como isto funcionaria num filme. Havia um diretor, mas ele se matou e sua mulher.

Às vezes este tipo de coisa acontece em Hollywood que como Las Vegas é um lugar supersticioso. Um projeto ganha uma reputação e é um tipo de Jonas e todos se afastam ao ouvir o seu nome.

Por outro lado, eu gostei de “O Bravo” por razões que muitos não gostaram. Eu gostei porque muitos pensaram que não poderia ser feito, e eu gostei dele porque era claramente insano de fazê-lo. Bem, todos concordaram que o filme não iria fazer dinheiro, mas todos que estavam ligados a ele achavam que ele deveria ser feito de qualquer forma. Isto é completamente ilógico, é claro. Mas não se leva muito tempo no mundo do cinema para perceber que nada disso faz sentido. Havia também um sentimento estranho de que talvez pudéssemos fazer algo belo. “O Bravo” quase me matou – quase matou a todos, para ser honesto – mas é um filme do qual tenho orgulho. Foi conscientemente um dedo apontado para o nariz do Establishment, e como tal foi massacrado pela crítica americana quando foi premiado em Cannes competindo pela Palma de Ouro. Quando viu o filme o diretor Emir Kusturica disse ao meu irmão: “Parabéns. Vocês acabaram de fazer o primeiro filme comunista americano.”

As pessoas na Europa me dizem que gostam dele. Nunca foi lançado na América por que meu irmão estrela de cinema gosta de impor . Viel Feind viel Her. Isto é uma das coisas que amo nele.

Todos os filmes, por natureza, deveriam ser impossíveis de fazer. O que quero dizer é que sua visão do que ele e sempre estará além e deveria estar porque isto é o que são as visões.

Sonhos de perfeição nós os encaramos como lobos olhando o luar. Todos os filmes falham. Todos os filmes são fracassos. Se fossem perfeitos não teríamos que fazê-los.

Você entra num filme sabendo que ele fracassará, mas imaginando o quão perto chegou de ser responsável de conseguir. A mesma coisa é escrever livros.

Pessoa que querem certezas não deveriam fazer filmes. Elas deveriam se tornar contadores ou fabricantes de mercadorias viciantes que se decompõem para as quais há um mercado garantido. Como Hollywood, por exemplo.

Depois de “O Bravo” e a experiência em Cannes, comecei a passar mais tempo na Europa. Especialmente na França. Amo os franceses especialmente por causa das razões que muitos não gostam deles: eles discutem com você, eles tem opiniões. Eles não ficam bravos, eles cuidadosamente te explicam por que eles acham que você não vale nada. Eles esperam que você, em resposta, os explique por que eles não valem nada. Então todos bebem vinho, come bem e falam sobre sexo. Sempre achei que seria bom fazer cinema sob estas circunstâncias.

Tenho uma agente inglês que controla todo meu trabalho. Romances, filmes, tudo. Ela é uma das minhas melhores amigas. Eu ligo para ela para reclamar da minha vida pessoal, ela diz que sou um idiota e me manda trabalhar. Já tive quatro ou cinco agentes em Hollywood, na maioria das vezes eles não conseguiam lembrar meu nome. Ou, se lembravam, era porque tinha um roteiro para o meu irmão estrela de cinema. Eles frequentemente me mandavam para reuniões com produtores que também não tinham dinheiro.

Um dia minha agente inglesa me disse: “ Você está indo bem agora, pode finalmente escrever aquele romance.” Estávamos falando sobre eu escrever um romance policial sobre Hollywood. Eu tive, como dizem uma perspectiva única, ou seja, eu iria enfurecer muitas pessoas quando o escrevesse.

Os escritores geralmente não gostam de enfurecer Hollywood porque eles geralmente morrem de fome e sua única salvação é vender um romance para o cinema. Já mencionei que há muito dinheiro em Hollywood?

O negócio é que, estive em Hollywood e não dou a mínima.

Fonte: DeppLovers

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